O HINO NACIONAL E A PALAVRA DE ORDEM DA ELITE PAULISTANA.
ARTUR SCAVONE
O hino nacional cantado contra a vontade da Fifa na abertura da
Copa, que programou a gravação para terminar logo após os primeiros versos, foi
um momento tão emocionante quanto a virada do jogo. Os jogadores, o Filipão e a
torcida na arquibancada cantaram a plenos pulmões as estrofes inteiras até a
primeira parte do hino, que deveria terminar bem antes. Cantou a seco, sem o
acompanhamento gravado. Foi uma espécie de "calma lá Fifa, essa copa é
nossa, na nossa casa".
Sem
dúvida essa atitude mostra um sentimento de nação que há muito tempo Lula tem
invocado, contra aqueles que pregam uma postura de vira lata. É um
reconhecimento de nação que a elite nacional nunca quis ver florescer, porque
sempre temeu esse orgulho, essa apropriação de país.
A
ditadura e as elites festejavam a glória nacional sob a batuta das bandas
militares para abafar a total falta de democracia, a submissão aos interesses
norte-americanos e os "noventa milhões em ação" serviam para calar a
boca dos que resistiam à violenta exploração a que os trabalhadores eram
submetidos naquele tempo. Era uma ode à pátria amada dos militares. Não foi por
outro motivo que as organizações de esquerda que resistiram ao regime tinham
como lema "ou ficar à pátria livre, ou morrer pelo Brasil".
Poder
ver o povo brasileiro ter orgulho do que é seu, manifestar-se para reivindicar
seus direitos, e aprender a viver sob uma democracia ainda jovem e ameaçada
pelos interesses do grande capital, é uma alegria que só os que viveram a
opressão da ditadura podem festejar.
Mas
algo precisava destoar, afinal. E o tom desafinado veio da ala vip da platéia:
"Hei, Dilma, vai tomar no c.!" Essa foi a palavra de ordem da elite
paulistana, que marcou seu descontentamento com as políticas do governo
federal, bem ao estilo dos articulistas da direita truculenta. A elite
paulistana está tentando aprender a viver sob a democracia, mas ainda há muito
chão pela frente porque, convenhamos, esse xingamento grosseiro não é
exatamente uma palavra de ordem que expresse uma posição política, mas um ódio
de classe incontido, tal qual uma fratura exposta. Não é próprio da democracia.
A conclusão, afinal, é que Marilena
Chauí tem razão: a classe média paulistana ainda é uma abominação
política e ética, no mínimo. Mas Dilma já disse, não custa relembrar:
"Prefiro as vaias da democracia, do que os aplausos da ditadura".